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Anti-heroína de Pindaíba


   Antônio Hohlfeldt (Jornal do Comércio 18 de abril de 1997)

Fotos de Adriana Franciosi

   Ao completar 19 anos de vida, traída pela Administração Popular que se nega a dar qualquer apoio à  idéia de sua permanência no local em que fez história na cidade, nem por isso a trupe de atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz perde sua fleuma e sua força. Aniversário se faz com festa e festa, para um grupo de teatro, é representar. Foi o que fez o Ói Nóis..., estreando seu novo espetáculo de teatro de rua, A Heroína de Pindaíba.


   Trata-se da adaptação de uma peça de Augusto Boal, dos tempos do seu exílio na Argentina (1975), originalmente intitulada O homem que era uma fábrica. O texto original era uma fábula e, apesar ou justamente por causa das adaptações sofridas, mais fábula e mais farsa ficou ainda o espetáculo que conta a história de Matilda Silva da Silva (o povo brasileiro) que sonha emigrar para os Estados Unidos, deixando Pindaíba (Brasil). Para tanto, e após passar por um sem-número de exigências e exames norte-americanos, que não escondem terríveis preconceitos, ela se descobre “autora” do mais puro cocô da face da terra, o que deixa encantado os próprios norte-americanos. Passam a usa-la como garota propaganda, numa tentativa de comprar a boa vontade do Tio Sam. É quando Matilda, auxiliada por uma amiga, dona do “jeitinho brasileiro”, muda parcialmente de planos; passa a ganhar algum dinheiro, alugando seu “produto” para outros interessados na imigração, até ser descoberta.

   O tema é farsesco, o tom é  farsesco e farsesca é a perspectiva de todo o espetáculo que diverte e critica a realidade brasileira imediata. É surpreendente que um texto daquela fase de Boal evidencia a sua atualidade: capacidade do dramaturgo ou, infelizmente, falta de evolução do país? Acho que as duas coisas. De qualquer maneira, o fato de ser um espetáculo de rua obriga a alguns cuidados e a algumas técnicas que o Ói Nóis Aqui Traveiz evidenciar dominar a contento hoje em dia, inclusive a intromissão de espectadores do público que, muitas vezes, promovem leituras muito “particulares” do texto.


   Como espetáculo coletivo não há, estritamente falando, nomes a destacar. Mas Tânia Farias, que interpreta Matilda, é sem dúvida uma atriz extremamente versátil, de extraordinária capacidade mimética, de ótima projeção vocal. Da mesma forma, a atriz Rosane Cardoso, que vive sua amiga, e Paulo Flores, que faz uma série de papéis, entre os quais o Embaixador.

   O novo trabalho do Ói Nóis aqui evidencia um bom nível em que se encontra o grupo e, muito especialmente, a sua correta compreensão quanto a uma estética específica para o teatro de rua. É espetáculo imperdível, quando se tiver oportunidade.